Não é mais segredo que a Meta prepara uma nova rede social para aproveitar o vácuo que Elon Musk criou após destruir, digo, assumir o Twitter.
O Projeto 92 — provável nome comercial Threads — já teve imagens vazadas e, ouviu-se da boca de um executivo da Meta, será compatível com o ActivityPub, o protocolo por trás do Mastodon e de outras aplicações do fediverso.
No último fim de semana, um burburinho insinuava que administradores de grandes servidores do Mastodon teriam se encontrado, em segredo, com representantes da Meta.
A suposta notícia virou uma bola de neve com centenas de administradores assinando um “pacto anti-Meta”: desde já, eles se comprometem a bloquear a nova rede social da Meta assim que ela for lançada.
Entendo essa postura. Se tem uma empresa nessa área que não é confiável, é a Meta. Há todos os motivos do mundo para desconfiar das suas intenções. Imaginar que Mark Zuckerberg ameace a existência do fediverso não é um delírio; é uma avaliação sensata de um risco real.
Só a escala com que a Meta é capaz de lidar, e que provavelmente terá no primeiro dia da sua nova rede (ela será derivada do Instagram, com +2 bilhões de usuários), já coloca em xeque a sobrevivência da maioria dos servidores no fediverso. Uma conexão abrupta com um par gigantesco pode sobrecarregar sistemas e nocauteá-los.
Lembremo-nos da migração em ondas do Twitter para o Mastodon, que, em uma escala muito menor, fez muito servidor suar para continuar de pé.
Por outro lado — e corro o risco de estar sendo ingênuo —, pesa o genuíno interesse em estabelecer contato com gente que apenas não se importa tanto a ponto de buscar alternativas às redes sociais comerciais e saber ou aprender o que é “Mastodon”, “ActivityPub” e “fediverso”.
Essa galera é maioria e continua no Instagram, no Facebook, no Twitter. A perspectiva de ficar onde estou e poder interagir, daqui, com mais gente, é empolgante.
Até onde sei, duas instâncias brasileiras, bantu.social e nuvem.lgbt, assinaram o pacto anti-Meta. O meu humilde servidor monousuário, não. Seguirei atento.
Pq vc não abre o seu servidor monousuário para os assinantes do canal, Guedin?
A aplicação que uso, Microblog, só permite um usuário mesmo. A gente não descarta subir uma multiusuário no PC do Manual, ainda que isso não esteja nos planos imediatos — temo que seria muito difícil de gerenciar e consumiria o nosso parco servidor.
Me pego imaginando este futuro e as consequências ele traria.
Seria um “Facebook” integrado a um protocolo aberto. Se esse protocolo conta com um bom número de usuários – por exemplo, se outras big techs estão conectadas a ele, talvez isso abra oportunidades para obtenção de novos usuários, em vez de redes fechadas em jardins murados, como tem sido feito atualmente.
Penso isso por conta do TikTok, por exemplo, que chega a ter o ícone do WhatsApp em sua interface, usando a rede vizinha quase como um espaço de divulgação, com a sua logomarca ao final dos vídeos compartilhados. Um protocolo que integra a big tech não seria muito diferente.
Além disso, com algo como o ActivityPub, a Meta poderia ter redes modulares e, em vez de, por exemplo, descaracterizar o Instagram, mudando o foco para stories, depois para vídeos, depois de novo para fotos, conseguiria criar serviços anexos, que poderiam ser desativados ou preservados, a depender da demanda dos usuários e da moda do momento. Seria um futuro mais ambíguo, mais modular, no qual fugir da big tech seria ainda mais difícil.
E mais, estaríamos em um plano no qual os protocolos e suas finalidades teriam mais importância do que as plataformas em si. Cada um com sua finalidade, sem ‘ilhas’ muito independentes, mas ‘fluxos’ de uso.
Quis registrar esse breve delírio aqui.
Isso seria a ideia geral de substituir Plataformas por Protocolos, acho que é uma idéia com alguma fama, e tem o exemplo histórico bem sucedido do e-mail.
Então, por exemplo em vez de Whatsapp e telegram e signal serem jardins murados, com cada um com um número de usuários que ficam dentro da plataforma (e com isso ganham escala e impedem na prática o surgimento de outras), as pessoas instalam um único protocolo específico para alguma função («protocolo de mensageiro para comunicações privadas» por exemplo), e podem escolher um programa para utilizar esse protocolo, com total inter-compatibilidade. Então se o João quer Whatsapp, ele usa isso, se o Severino quer o signal, ele usa isso, e joão e severino podem mandar mensagens privadas entre si.
Existe um óbvio obstáculo social: Nenhuma plataforma vai querer destruir os muros de seu jardim. Elas iriam sucumbir a um mercado muito mais competitivo e seriam facilmente substituíveis por utilizadores. talvez o whatsapp tivesse morrido com os escandalos da meta, e geral utilizasse telegram e signal agora, se o whatsapp não fosse um jardim murado com 1 bilhão de pessoas.
Outro problema prático : como definir exatamente cada protocolo e suas características. Será que todos iriam querer que o protocolo de mensageiros privados fosse universalmente encriptado de ponta a ponta, só aceitasse membros com número de telefone (se bem que já é assim, acho que só o Messenger que não exige telefone até hoje…), etc.
Não estaria livre de problemas potenciais, tipo o oligopólio na prática dos provedores de emails (diga um que não seja hotmail ou gmail, e quantos o utilizam), mas ainda acho que seria um avanço gigantesco ao que temos hoje.
Acho que, em geral, tenho comigo a ideia de que essa maior presença de protocolos é benéfica… Mas admito que, quando coloco em conta as big techs demonstrando interesse nisso, entendo ser necessário cautela.
Há uma série de diferenças importantíssimas aqui, mas vou aceitar que estou em um exercício imaginativo e navegar nessa ideia. Uma das coisas que me faz pensar sobre isso é a concepção que se tinha sobre o open source, que nasce de bases que supunham um processo bem mais revolucionário e anticorporativo do que se realizou. Um projeto como o Chrome, por exemplo, mantém uma base de código aberto sem que seu monopólio seja colocado em questão e sem que o projeto da engine escape das suas mãos. A ideia de que existem dezenas de navegadores parecidos influi muito pouco no comportamento dos usuários.
De volta ao nosso pensamento aqui, uma plataforma possivelmente compatível com o protocolo ActivityPub, mas que seja massiva, como o Facebook ou Instagram, teria um comportamento diferente daquelas que conhecemos hoje. Haveria força e popularidade para simplesmente não se conectar com aquelas instâncias que não fossem interessantes economicamente, fidelizar usuários com base na interface e serviços adicionais, bem como atuar ativamente e guiar o processo de desenvolvimento do protocolo (aqui me falta conhecimento técnico sobre o desenvolvimento de algo assim, mas suponho que demande algum nível de evolução constante, como um padrão web ou um software convencional).
Enfim, penso que a flexibilidade de um protocolo talvez permita ainda mais integração em atividades cotidianas, que seriam novas dimensões em potenciais de entrada da big tech. E que, apesar de concordar contigo no paralelo com os e-mails, talvez essas corporações não queiram exatamente derrubar seus muros, mas transformá-los em uma outra coisa, mais difusa e flexível, mas mais resiliente também.
Alternativas ao Twitter estão nascendo de todos os lados mas sera que ao menos uma irá vingar? O público quer estar aonde todo mundo já esta, o que levaria alguém a trocar o twitter que tem bilhões de usuarios por outra que vive as moscas como o Mastodon?
Isso vai contra a teoria. Bom artigo: https://daringfireball.net/linked/2023/06/19/not-that-kind-of-open
Hélio, acho que o texto do Ghedin coloca um argumento prático em jogo, que é a questão da possível sobrecarga dos servidores. Mas é aquilo, como diz o Gruber: a ideia do ActivityPub não é, necessariamente, ser anticorporativo ou anticomercial…
Dizer essa última coisa, entretanto, me gera algum incômodo
Melhor bloquear do que ser afetado por uma big tech monopolista que torna podre tudo que toca.
Imagina ser inundado por um mar de toxidade, falsidade e ódio que são as redes do facebook. Eu sei que o fediverso tá longe de ser perfeito e de vez em quando rola uma treta, mas isso tá bem longe de ser comparável com as redes sociais comerciais.
Se minha instância não bloquear, eu mesmo bloqueio. Que se dane o facebook/meta!
Não vejo problema nos adms quererem ser cautelosos quando o assunto é uma provável ameaça da Meta. Acredito que se a medida se provar exagerada no futuro, as instâncias podem muito bem voltar atrás.
que genial (com ironia)
Poderia desenvolver? Eu não participo do fediverso e o pouco que me informei a respeito foi aqui no MdU e algumas arrobas do twitter quando tavam migrando. Tenho curiosidade genuína de entender melhor, até porque eu basicamente tou fora de redes sociais, mas fico olhando pra ver se surge algo que me atraia.
oloco, foi um comentário zero construtivo e em desabafo sem argumentos do que me incomodou hahahaha
não sou a pessoa ideal pra ajudar nos pontos que você levantou. até hoje sigo limitado em pensar “num Twitter” em que você conversa com vizinhos desconhecidos, sem valor para o grafo social. é grosseiro, eu sei, mas eu uso muito o Twitter junto de amigos e conhecidos; interações maiores, notícias e memes são secundários pra mim. ao valorizar o grafo social, não consigo ter o Mastodon na minha rotina.
do meu incômodo que leva ao comentário, é de ser mais um fator que mantém o Mastodon isolado do mundo – naturalmente ignorando qualquer questão técnica ou profunda que levem a essa decisão.
Acho um tiro no pé isso, é dar de bandeja o protocolo nas mãos do facebook, que vai ter facilmente a maior instância em quantidade de usuários. Entendo o argumento da performance, esse sim acho válido.