Manual em um universo alternativo

Várias pessoas segurando celulares, uma ao lado da outra, em um ambiente com iluminação fraca.

Em meados de 2019, publiquei algumas matérias em uma série que batizei de “Universo alternativo”. Eram histórias de aplicativos e ambientes digitais populares no Brasil, até então ignorados pela imprensa.

Em julho, farei um experimento no Manual do Usuário que me remete a algo de um universo alternativo: ao longo do mês, usarei todas as redes sociais, até as mais tóxicas, como Twitter, Facebook e Instagram, para espalhar os textos, vídeos e tudo mais que produzir aqui.

Passei bem os últimos anos sem presença nesses ambientes, locais que, para quase todo mundo, são considerados obrigatórios para quem quer ser visto e lembrado. O Manual nunca esteve no TikTok; não tem presença no Facebook e Instagram desde o final de 2018; e abandonou o Twitter em dezembro de 2022. E… bom, estamos aí, firmes e fortes.

Por que mudar isso agora? Estamos passando por um momento que, acho eu, é de mudanças profundas. Quis aproveitar a carona para tirar algumas dúvidas e aprender no caminho.

As redes sociais são cada vez menos sociais, mais performáticas e orientadas a negócios. É a vitrine do pequeno comerciante, o SAC das empresas, o monopolizador da atenção que faz surgir impérios de “influência” e os “criadores de conteúdo”, gente que vive de alimentar essas grandes máquinas de roubar tempo e atenção. Às vezes, vemos um ou outro post de amigos e familiares.

Ao mesmo tempo, e em parte por essa transformação, há um cansaço generalizado dessas redes. E, mesmo assim, seguidos de olhos grudados nelas. Quando muito, trocamos o Instagram pelo TikTok ou o Facebook pelo WhatsApp.

Correndo por fora, iniciativas pautadas em descentralização, como Mastodon e Bluesky, se apresentam como alternativas mais saudáveis ao modelo comercial de Meta, Google e cia.

Talvez saudáveis demais: tal qual um prato de salada ao lado de um hambúrguer e um pote de sorvete, é difícil resistir à tentação se a alternativa “melhor” é menos prazerosa, mesmo que bata o arrependimento depois. E, convenhamos, com sistemas de convites e experiências de usuário complexas, é como se a salada viesse em uma embalagem difícil de abrir, do tipo que desanima até quem gosta de folhas e legumes.

O Manual do Usuário tem uma vantagem importante em relação a outras publicações que é não depender de audiência bruta — números enormes de visualizações de páginas, no site — para se manter.

Por isso, em julho farei uso das redes da maneira dita “nativa”, sem a ânsia de tirar pessoas de lá para trazê-las ao site. Uma notinha, um vídeo ou até mesmo um textão podem aparecer na íntegra no LinkedIn ou no TikTok, e está tudo bem.

Não me entenda mal: minha prioridade é e sempre será plataformas abertas, em que eu tenha algum controle. Hoje, são o site, esta newsletter e o Mastodon. Durante os 31 dias de julho, farei um (grande) esforço para abranger também outros ambientes digitais onde não tenho tanta familiaridade ou interesse em estar.

Tenho uma incompatibilidade inerente com as empresas, as premissas, os incentivos e até os formatos que são promovidos nas redes sociais comerciais. Margeá-las é uma estratégia comercial e editorial, sim, mas é também uma estratégia de sobrevivência. Eu não aguentaria, por exemplo, manter o ritmo de “stories” que o Instagram exige para entregar conteúdo, nem a predominância do vídeo em todo lugar hoje.

Este experimento de um mês — que tenho certeza será só isso, um experimento — é uma tentativa de auferir o que estou “deixando na mesa”: o contingente de pessoas com quem não falo, gente que talvez se identifique e até goste do que eu escrevo e que não chega até aqui por qualquer motivo, talvez por passar tempo demais no Instagram e no TikTok.

Corre-se esse risco ao abdicar do “ir aonde o povo está”, uma máxima do jornalismo que me soa esforço demais em alguns casos, como o meu com as redes sociais comerciais.

No mais, espero que seja interessante também para ter uma noção melhor, mais “mão na massa”, dos produtos de empresas que cubro, e como esse trabalho extra afetará o que já faço no site.

Em agosto, eu conto como foi. Se quiser acompanhar a jornada em tempo real, siga por aqui: Facebook, Instagram, Telegram, TikTok e Twitter.

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Foto do topo: Camilo Jimenez/Unsplash.

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12 comentários

  1. Bem vindo ao meu mundo! Hahaha [riso nervoso]. Estar presente nas redes sociais é um esforço (essa é a palavra) que preciso fazer para manter meu trabalho rodando. Não tem jeito. Acontece que meu “público” é presente nas redes, e se eu não estiver por lá, eles não lembram ou sabem o que faço. Infelizmente, porque isso motivo de muitas agonias por aqui, mas fazer o quê…

    Enfim, estou curioso pra saber qual retorno o Manual terá com isso e o que você achou da experiência.

  2. Li os três textos da “universo alternativo” e fiquei um pouco impressionado com os comentários sobre o biugo/noizz, que eu nunca tinha ouvido falar: várias pessoas, provavelmente chegadas pelo google, dizendo que aparece notificação de gente solictando amizade/enviando mensagem direta, mas ao clicar não conseguiam descobrir como fazer pra ler, não achavam onde ficam as mensagens e pediam ajuda com isso. Achei bem curioso. O que poderia justificar esse comportamento do aplicativo? Bug? Notificação propositalmente fake pra levar o usuário a abrir o aplicativo?

  3. Trabalho com tecnologia e leio o manual pq compartilho a visão e os valores editoriais. Assim como você, tento me manter longe dessas rede sociais. Como leitor, esse experimento vai ser muito interessante. Por favor, nos informe os resultado do experimento. Se possível, com números.

  4. Só para levantar uma polêmica…

    Se já está na levada de que “não vai dar certo” não fica meio enviesado o “experimento”?

    Não seria melhor ir mais de “coração aberto”?

    (Veja o cuidado na escolha das palavras… 😁)

    1. Sim! Um dos desafios é o próprio experimento, ou (tentar) ir de “coração aberto”, principalmente nas partes em que me exponho mais, como vídeos.

      O “não vai dar certo” é mais no sentido de sustentar isso indefinidamente. Fiz um test drive nas duas últimas semanas e a primeira coisa que percebi é que é um ritmo meio insustentável — alimentar tantos espaços distintos, tendo o site e outras atribuições que já tenho, é demais para uma pessoa só.

      1. Realmente, são muitas redes e formatos diferentes que dificultam demais o processo. Ainda mais para uma operação de uma pessoa só.

        Entendo perfeitamente, foi mais uma provocação amigável do processo.

        Pessoalmente imagino que isso não possa ser sustentado mesmo a médio prazo fazendo sozinho.