Legado digital

Gosto muito de descobrir, destacar e apoiar quem faz coisas pequenas, quase artesanais, em/com software. Desenvolvedores, estúdios, gente talentosa que opta por um caminho mais humano, menos corporativo; que se concentra em fazer coisas legais e a viver delas.

Quase sempre, essas pessoas têm histórias inspiradoras. Às vezes, essas histórias têm um triste final precoce.

Quarta passada (16), Kris Nóva, escritora, engenheira líder no GitHub, fundadora da Fundação Nivenly e da instância Hachyderm (Mastodon), morreu em um acidente de alpinismo.

No início de agosto, Bram Moolenaar, 62 anos, criador do editor vim, apresentou um quadro médico de rápida evolução e faleceu.

Em março, Alex Hay, 36, desenvolvedor de aplicativos para iOS, como o Toolbox Pro, faleceu vítima de um câncer.

Às vezes, toda a interação que temos com o trabalho de gente como Kris, Bram e Alex é restrita à tela. Não sabemos quem está por trás, em que condições, lidando com quais dificuldades.

Eventos trágicos do tipo nos levam a refletir, a confrontar a mortalidade. A nos colocarmos nos lugares de quem se foi e dos que ficaram.

Quase todo mundo tem uma rede social, muitos têm projetos digitais. Se acontecesse algo comigo, como quem lê o Manual ficaria sabendo? O que aconteceria com o site? Eu realmente não sei.

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14 comentários

  1. Vim procurar o post sobre o podcast do PC do Manual (para redigir o e-mail sobre minha pretensão de ajuda futura…) e lendo este, me afundei num abismo de reflexão…

  2. Anos atrás, quando Ghedin foi para a Gazeta do Povo, outra pessoa começou a tocar o Manual.

    Eu parei de acompanhar o Manual nessa época, pois, eu acompanho o Ghedin, e não o Manual. Se ele mudar o nome do site pra “Notícias lentas para pessoas rápidas”, ainda assim continuarei acompanhando, pois continua sendo o Ghedin.

    Por isso, penso que, numa fatalidade em que o Ghedin passar dessa para pior / melhor, o site não deve passar para outra pessoa. Deve ficar parado, sem atualizações. Daí, daqui a anos, ao olhar o site, as pessoas vão dizer: “puxa, este foi o último posto do Ghedin. E foi falando sobre Linux. Quem iria imaginar isso”.

    Outra pessoa começar a tocar o projeto pra mim perderia todo o sentido.

    Sobre a brevidade da vida, o melhor a fazer é aproveitar enquanto vivemos. Depois que morrermos, não vamos existir para nós preocupar com qualquer outra coisa.

  3. Não importa se você morrer, pq você e o manual sempre estarão vivos nos nossos corações.

  4. Não vai transformar isso em ideia fixa, daquelas que afetam o sono, tiram o sentido e o entusiasmo de tudo que você fizer. Ou seja, ainda é muito cedo pra virar um desses velhos mal-humorados que a gente vê nas filas do supermercado, salas de espera de clínicas etc. Pensa que tudo é impermanente, somos todos parte de um universo que não para a cada partícula que desaparece. Siga o movimento e se divirta enquanto está nele.

  5. Às vezes as circunstâncias nos levam a refletir sobre o nosso legado no mundo, às vezes refletimos sobre isso sem uma razão específica… Falando sobre algo que me ocorreu recentemente, em breve eu irei me ausentar do trabalho, e confesso que fiquei um pouco surpresa o quão rápido pensaram em uma substituta para mim (uma amiga da chefe, por sinal). Eu sei que o trabalho não para e existem as demandas que precisam ser atendidas, mas sempre pensei que o funcionalismo público fosse um pouco diferente da iniciativa privada e o funcionário não fosse uma peça que pudesse ser substituída de forma tão fácil. Eu estava enganada, com uma boa antecedência já tinha alguém pro meu lugar. Bom, no caso do Manual é diferente. Não tem quem substitua você e seu trabalho, ele é único. Acho que isso faz com que essas iniciativas (como essas que vc citou) se tornem mais especiais e o seu trabalho ainda mais relevante. Não sei os motivos que fizeram vc refletir sobre isso, mas espero que esteja tudo bem!

  6. Estamos transpondo nossa vivência para os bits e deixando de lembrar que somos feitos de células e átomos. Bancos digitais, assinaturas digitais (nem sempre vinculadas a um CPF), as playlists, bibliotecas e afins em plataformas fechadas, os automatizadores de lugares que só vc conhece, mas que fazem um monte de coisas funcionarem para outros ao seu redor, são coisas que a gente não parou pra documentar adequadamente (talvez pq nem tenha dado tempo de se dar conta de onde a gente se enfiou). Há muito para falar sobre isso.

  7. Ao longo da pandemia eu refleti algumas vezes sobre o assunto e o resultado foi criar um caderninho de senhas e e dicas de acessos, além de indicar algumas pessoas para terem acesso ao meu legado digital.

    Claro que minha esposa achou um absurdo num primeiro momento. Eu disse que era um voto de confiança para não depender de burocracias para encerrar coisas bobas, como cancelar uma conta de água, uma rede social ou uma conta de e-mail.

  8. Ghedin, se o Manual, em certo momento, parasse, eu iria correndo atrás da Jaqueline ou do Felitti. Acho que o Manual, por não ser exatamente um software, mas um projeto midiático, dá uma outra forma de presença pra você.

    Mas admito que sinto minha resposta um pouco tangencial ao questionamento que você fez. Se cuida por aí, beleza?

  9. Talvez algum site noticiaria sua morte porque você tem reputação no mundo digital. E seu site se transformar em um espécie de arquivo salvo, no estilo de Internet Archive.

    Isso me lembra que recentemente ativei um plano para a Google encerrar a minha conta se permanecer por x meses após inatividade depois da minha morte. Por ora, configurei somente para conta Google.