Controle de video game e gambiarras

Controle de video game Logitech F710 adaptado, nas mãos de Stockton Rush, presidente da OceanGate e uma das vítimas da implosão do submersível Titan.

Chegou ao fim, da pior maneira possível, a aventura de cinco homens ricos que queriam ver de perto os destroços do Titanic, afundado em 1912 durante sua viagem inaugural após se chocar com um iceberg.

Destroços do Titan, submersível da empresa OceanGate usado pelo grupo para descer até o Titanic, foram encontrados nesta quinta (22), dias após ele perder contato com o resto do mundo. A Guarda Costeira dos Estados Unidos informou que a embarcação implodiu.

Sem esse desfecho trágico, seria apenas mais uma excentricidade de gente muito rica, que tem US$ 250 mil para torrar em um passeio perigoso e para poucos.

“Excentricidade” talvez seja um eufemismo nessa história. Fora o risco de descer tão fundo no oceano (o Titanic está 3.700 metros de profundidade), havia vários sinais de alerta no Titan do tipo que levam alguém a rever a decisão de embarcar.

O mais intrigante era o controle de video game de US$ 30, modelo Logitech F710, usado para guiar o submersível.

Em um vídeo, Stockton Rush, presidente da OceanGate e uma das vítimas fatais, explica o funcionamento do controle Bluetooth, dizendo que ele é “super durável”. Rush classifica a escolha do acessório como “uma abordagem completamente nova no projeto do submersível”. Havia alguns controles sobressalentes, só por precaução.

O Titan confiava em postes de construção usados como lastro. Ele era guiado por mensagens de texto enviadas da superfície, e essa comunicação só funcionava se submersível e barco estivessem alinhados. Não havia qualquer localizador de emergência. Por fim, o Titan era parafusado do lado de fora, ou seja, não havia como os tripulantes saírem lá de dentro por conta própria.

Em 2022, o correspondente de tecnologia da CBS, David Pogue, fez a mesma viagem. No vídeo, é visível seu desconforto em vários momentos.

Pogue menciona que não conseguiu deixar de notar que muitas partes do Titan pareciam improvisadas e chega a questionar o jeitão “gambiarra” do Titan a Rush, presidente da OceanGate.

O executivo aventureiro responde que as partes críticas da embarcação, como sua estrutura pressurizada de fibra de carbono, são confiáveis, feitas em parceria com a Nasa e a Boeing.

Em seu site (no cache do Google), a OceanGate justifica a falta de certificações do Titan por órgãos independentes que atestam padrões mínimos de segurança. “Por definição, a inovação está fora do sistema já aceito”, diz o texto.

Na expedição que Pogue acompanhou com sua equipe de filmagem, em uma das descidas o Titan se perdeu por cerca de cinco horas. “Eles ainda podiam enviar mensagens curtas para o submersível, mas não sabiam onde ele estava”, escreveu o jornalista no Twitter. “Estava quieto e muito tenso, e eles desligaram a internet do navio para nos impedir de tuitar.”

Cinco pessoas morreram no Titan:

  • Hamish Harding, empresário britânico, 58 anos;
  • Shahzada Dawood, empresário paquistanês, 48 anos, e seu filho, Suleman Dawood, 19;
  • Paul-Henri Nargeolet, explorador francês, 77 anos; e
  • Stockton Rush, presidente da OceanGate, 61 anos.

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Imagem do topo: @CBCNL/YouTube.

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10 comentários

  1. Eu achei sem sentido esse tipo de expedição, pagar pra ir em um lugar extremamente arriscado pra ver destroços de uma desgraça que aconteceu à 100 anos, sendo que não tem nada de mais a se ver. Independente se a viagem custasse 250 mil ou 25 dólares.

    Pra mim faz muito mais sentido ir pro espaço, vê de cima o planeta que você nasceu deve ser uma experiência única.

  2. Que péssimo tom na matéria.
    Quer dizer que porque são ricos mereciam morrer? Felicidade porque aconteceu?
    Basta ver as reações a postagem no canal do Manual no Telegram pra perceber como está a cabeça das pessoas.

    1. Os textos do Ghedin são sempre respeitosos, razoáveis e repletos de urbanidade. Parece-me que você esperava deste texto uma deferência exagerada e desnecessária aos tripulantes/passageiros.

      Eu (que sou um zé-niguém) comemoro sempre a morte de bilionário, mas nunca vi isso acontecendo neste sítio — e não é por isso que vou projetar aqui minhas expectativas. Sugiro, Lontra, que você também não projete.

    1. Considerando a complexidade é bem possível mesmo.

      A diferença é que enquanto um desdenhava dos processos rígidos e mesmo dando merda em vários passeios continuava com a loucura. O pessoal dos passeios no espaço “parece ser mais rígido” quanto aos protocolos de segurança.

  3. Acredito que os tripulantes não tinham a verdadeira noção do risco que corriam, provavelmente isso deve ter sido omitido deles ou não teriam embarcado.

  4. A sanha por exclusividade tão alimentada pelo capitalismo gera vítimas fatais diariamente mas dessa vez elas foram de pessoas que habitam o topo da pirâmide.
    Gostaria de acreditar que isso vai fazer com que algo mude no modus operandi do bobão endinheirado mas não vai.