União Europeia aplica multa recorde à Meta — € 1,2 bilhão (~R$ 6,5 bi).

A União Europeia multou a Meta em € 1,2 bilhão (~R$ 6,5 bilhões). O motivo é a transferência de dados de usuários europeus do Facebook para os Estados Unidos. Além da multa, o bloco deu seis meses para que a Meta cesse a transferência de dados entre Europa e EUA.

É a maior multa já aplicada pela União Europeia com base no Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR, na sigla em inglês). Andrea Jelinek, chair do Conselho de Proteção de Dados Europeu (EDPB), disse que “a multa sem precedentes é um forte sinal para empresas de que infrações sérias têm consequências de longo alcance”.

Em resposta, executivos da Meta fizeram objeções à decisão em um post no site da empresa. “A capacidade dos dados serem transferidos pela fronteiras é fundamental para o funcionamento da internet aberta global”, escreveram.

E… talvez a Meta tenha um bom argumento aqui? Embora o EDPB tenha fundamentado a decisão no artigo 46(1) do GDPR, que permite a transferência de dados a outros países desde que haja salvaguardas apropriadas e remédios legais estejam disponíveis (leia-se: evitar a espionagem estrangeira), dizendo que a Meta foi negligente “no mais alto nível”, a punição determinada pode, sim, inviabilizar o funcionamento do Facebook na Europa.

A Meta vai recorrer. A empresa espera, porém, que as tratativas entre EUA e União Europeia a respeito de um acordo de transferência de dados, iniciadas em 2022, sejam formalizadas antes do fim do prazo de seis meses. Um acordo do tipo, conhecido como Privacy Shield, foi invalidado pela suprema corte europeia em 2020 após ser questionado por um ativista austríaco, Max Schrems. Via EDPB, Meta, New York Times e Ars Technica (todos em inglês).

Depoimento do CEO do TikTok no Congresso dos EUA foi uma perda de tempo.

Nesta quinta (23), Shou Zi Chew, CEO do TikTok, foi escrutinado no Congresso norte-americanos por mais de cinco horas (íntegra).

Congressistas dos dois lados do espectro — democratas e republicanos —, unidos pelo temor de que o aplicativo chinês seja uma arma comunista ou qualquer delírio do tipo, pegaram pesado com Zi Chew.

No fim, foi uma perda de tempo, uma mistura de delírio com sinofobia, polvilhada por grosserias gratuitas. Ficou evidente a má-vontade dos congressistas, pouco interessados em elucidar suas dúvidas e avançar o debate, mais preocupados em bater forte no TikTok.

O destino do TikTok nos Estados Unidos, e consequentemente no mundo inteiro — visto que os dois canais de distribuição do aplicativo são da Apple e Google, duas empresas norte-americanas — segue em suspenso.

Enquanto Zi Chew apanhava no Congresso, Pequim bateu o pé: o governo chinês disse que se oporá fortemente a uma venda forçada do TikTok e que um movimento do tipo “prejudicaria seriamente a confiança de investidores do mundo inteiro, incluindo da China”, nos Estados Unidos. Via Washington Post (em inglês).

O balão chinês que sobrevoou (e foi abatido pel)os Estados Unidos.

Os Estados Unidos derrubaram um balão chinês (vídeo) que sobrevoou seu espaço aéreo sem permissão no sábado (5).

O governo estadunidense alega que o objeto se tratava de um satélite espião e, por isso, adiou a visita do Secretário de Estado, Anthony Blinken, à China.

O governo chinês afirmou que era um balão meteorológico de uso civil que desviou de trajetória devido a fortes ventos e condenou veementemente o uso da força militar para o abatimento, destacando que se reserva o direito de agir da mesma maneira no futuro.

Também foi confirmado o sobrevoo sobre a América Latina e o Caribe de um segundo balão.

As diferentes narrativas foram analisadas pelo acadêmico Graham Webster, que assinala que o fato de ser uma pesquisa científica civil não descarta a possibilidade de uso militar por parte da China.

O New York Times pondera os significados do episódio sobre o que se supõe da liderança de Xi Jinping. Do outro lado do Pacífico, Dingding Chen frisou que o episódio não passa de um drama inflado pela mídia e por motivos eleitoreiros. De fato, apesar de reclamar do “exagero” estadunidense, Pequim já estaria sinalizando vontade de retomar a rotina diplomática, conforme matéria do Wall Street Journal.

A repórter Yaling Jiang acompanhou a reação das redes sociais chinesas com relação ao episódio. Segundo sua análise, muitos fazem chacota da importância que os EUA estão dando ao balão e notam que Washington já fez muitos sobrevoos com balões espiões por aí. Apenas uma minoria das postagens dá razão às ações e suspeitas estadunidenses. Como mostra o What’s on Weibo, uma parcela considerável do público aproveitou a oportunidade para fazer chacota do “balão à deriva”.


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Mais de 30 mil perfis banidos do Twitter já foram “perdoados” por Musk.

Enquanto isso, no Twitter de Elon Musk, mais de 30 mil perfis banidos já tiveram o acesso restaurado.

Alguns casos são tragicômicos, como o do neonazista Nick Fuentes, banido novamente nesta semana, menos de 24 horas depois de retornar à plataforma. Motivo? Enalteceu Hitler numa conversa em um Spaces. Via Twitter is Going Great (em inglês).

Chips ganham protagonismo na disputa tecnológica entre China e Estados Unidos.

Em mais um capítulo da disputa tecnológica entre China e Estados Unidos, Washington mandou a AMD parar de vender seu chip de inteligência artificial mais avançado para a China, medida que se estendeu também à Nvidia.

Pequim considerou o banimento um ato de “hegemonismo tecnológico”, mas representantes do setor na China consideram que, apesar das dificuldades iniciais, a decisão dos EUA deve impulsionar a indústria chinesa de chips. Mas, em contraste, as restrições ao compartilhamento de tecnologia com a Huawei foram aliviadas para conter o avanço chinês na padronização tecnológica global, segundo apurou a Bloomberg.

De todo modo, os EUA estudam ainda limitar os investimentos feitos por empresas do país em companhias de tecnologia da China: o governo Biden estaria negociando com o Congresso a formulação de uma lei que exija a divulgação antecipada de investimentos em determinados setores industriais chineses e que dê ao governo o poder de vetá-los.

Ainda no campo da tecnologia, autoridades chinesas acusaram os EUA, especificamente a Agência de Segurança Nacional (NSA, em inglês), de tentarem hackear a Universidade Politécnica do Noroeste em Xi’an. A instituição participa ativamente em pesquisas envolvendo os programas aeronáutico e espacial chinês. Será que o jogo virou?

Falando de relações China-EUA, a pesquisadora Yuen Yuen Ang publicou um excelente texto na revista Noema sobre o que está em jogo na competição das grandes potências. Segundo a autora, longe de um “confronto civilizacional” ou de uma “nova guerra fria”, Pequim e Washington estão em uma corrida para domar os excessos do capitalismo, cada um a seu modo. Vale um cafezinho.


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Nos EUA, cancelamento de assinatura deve ser tão fácil quanto inscrição.

Que a nossa lei de defesa do consumidor é avançada, todos sabemos, mas isso não significa que ela seja perfeita. Uma lacuna evidente é a facilitação do cancelamento de contratos de prazo indeterminado, como assinaturas de jornais.

A Federal Trade Comission (FTC na sigla em inglês), equivalente norte-americano ao nosso Cade, determinou que as empresas devem oferecer “mecanismos de cancelamento que sejam tão fáceis de usar quanto o método usado pelo consumidor para comprar o produto ou serviço”. A medida é parte de um esforço contra empresas que “empregam ‘dark patterns’ ilegais que enganam ou induzem os consumidores a serviços de assinatura”.

Um caso típico é o dos jornais: lá e aqui, a maioria facilita a assinatura, que pode ser feita pelo próprio consumidor sozinho, via internet. Na hora que ele resolve cancelá-la, porém, o único meio de fazer isso é por telefone, disponível em horário reduzido. A FTC quer acabar com isso. Fica a sugestão para o nosso Código de Defesa do Consumidor. Via FTC (em inglês).

Intuit compra Mailchimp por US$ 12 bilhões.

A Intuit comprou o Mailchimp por US$ 12 bilhões. Em 20 anos de história, o Mailchimp jamais levantou capital externo nem distribuiu participação entre funcionários — hoje, 1,2 mil pessoas trabalham na empresa. Segundo o comunicado à imprensa, o Mailchimp tem 13 milhões de usuários, 2,4 milhões deles ativos, e 800 mil pagantes.

Pouco conhecida fora dos Estados Unidos, a Intuit é bastante presente na vida dos norte-americanos. Estão sob seu guarda-chuva o QuickBooks, uma referência em software contábil para pequenas e médias empresas, e o TurboTax, principal aplicativo para declaração do imposto de renda. A Intuit também é famosa por seu lobby agressivo e táticas no mínimo questionáveis para ocultar dos norte-americanos alternativas gratuitas ao TurboTax. Bom para os donos do Mailchimp, não muito para os funcionários (sem participação, eles dividirão um bônus de US$ 300 milhões, ou 2,5% do valor do negócio, cerca de US$ 250 mil cada) e algo inquietante para os usuários do serviço. Via BusinessWire (em inglês).

Você não acredita realmente no lance de urinar em garrafas, né? Se isso fosse verdade, ninguém trabalharia para nós.

— @AmazonNews, perfil oficial da Amazon no Twitter, em resposta a um congressista do Wisconsin.

Exceto que fazer xixi em garrafas é, sim, uma prática (e bem documentada) comum entre entregadores que trabalham para a Amazon nos Estados Unidos. A Vice reuniu alguns relatos.

O mega vazamento de dados no Brasil / GameStop e r/WallStreetBets: um novo desafio às plataformas

Apoie o Manual do Usuário:
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Manual do Usuário em vídeo:
https://www.youtube.com/c/manualusuariobr

Nesta semana, Rodrigo Ghedin e Jacqueline Lafloufa destrincham dois assuntos espinhosos. No primeiro bloco, o mega vazamento de dados ocorrido no Brasil e que afeta praticamente todas as pessoas do país (e mais um tanto que já morreu). De quem é a culpa? Quais os riscos? O que fazer para se proteger?

Já no segundo bloco, falamos da maluquice envolvendo um grupo no Reddit, o r/WallStreetBets, as ações de uma empresa moribunda, a GameStop, e uma ação coordenada que deixou alguns fundos de investimentos bilionários de joelhos. No meio dessa história, empresas de tecnologia se viram diante de um novo desafio de moderação.

No fim, Jacque indica o livro Falando de economia com minha filha, do Yanis Varoufakis (ouça uma indicação estendida no podcast dela) e Ghedin, o filme Estado de união, do inglês Nick Hornby.

Donald Trump é o primeiro grande case de déspota digital auxiliado pela Big Tech

Essa história começa com dois fenômenos paralelos.

O primeiro. Como você entrou na internet? Pode ter ouvido de um(a) amigo(a) e resolveu, lá atrás, testar a conexão discada, as salas de chat, o IRC, o fazer amigos(as) só por mensagens de texto, sem nunca ter visto a cara ou ouvido a voz. Quando apareceram, as redes sociais se tornaram porta de entrada para milhões de pessoas. Você pode ter sido uma delas — no Brasil, lá por 2007, 2008, o Orkut era sinônimo de internet, enquanto no resto do mundo eram o MySpace e, depois, o Facebook. Gente fora daquele perfil entusiasta começou a aparecer — tua tia do interior, o povo todo do colégio e da faculdade.

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Cautela com o r/WallStreetBets e as ações da GameStop.

Enche o coração ver rico se dar mal, mas a história do r/WallStreetBets manipulando o valor de mercado da GameStop para lucrar em cima das vendas a descoberto (um “short squeeze”) de fundos hedge é mais complexa que isso. A história em si já é complexa; refiro-me ao contexto do evento.

As pessoas do r/WallStreetBets que organizaram o “hack” são niilistas com tendências antissistêmicas. Lembram sabe quem? Trumpistas/golpistas do Capitólio. Proto-terroristas do #Gamersgate. Jornadas de Junho/bolsonaristas ferrenhos. Tudo parece muito bonito, inspirador, até que a essência da coisa é subvertida (ou revelada) e nos deparamos com algo grotesco.

Não me entenda mal: o mercado de capitais é grotesco. Da ideia original de popularizar riscos e lucros, hoje ele é um fim em si mesmo. E é disso que decorre muitas das suas irracionalidades e injustiças, que o transforma em um cassino. (Não há maneira melhor de explicar a venda a descoberto do que sendo uma grande aposta.) O que o r/WallStreetBets fez foi instrumentalizar, na força bruta, algumas dessas irracionalidades para prejudicar os donos da banca e (importante dizer) enriquecer no processo. Há muito mais ressentimento e oportunismo do que senso de justiça norteando as ações deles.

Estamos (ou deveríamos estar) vacinados com o papo de “pior que tá, não fica”, e… bem, não precisa ir muito longe para sacar o ethos dos caras: a descrição do r/WallStreetBets é “Like 4chan found a bloomberg terminal illness.”

Facebook é acusado formalmente de monopólio.

Nesta quarta (9), quase ao mesmo tempo, a FTC e um grupo bipartidário de procuradores gerais de 46 estados e 2 distritos norte-americanos acusaram formalmente o Facebook de monopólio. Ambas as acusações pedem que as compras do Instagram (US$ 1 bilhão em 2012) e WhatsApp (US$ 19 bi em 2014) sejam desfeitas, e que haja maior escrutínio a futuras aquisições pelo Facebook. O principal argumento é de que o Facebook abusou do seu poder para comprar rivais em potencial e prejudicar os que não conseguiu, como quando bloqueou o acesso do Vine, do Twitter, à sua API. Em sua defesa, o Facebook diz que a investida é “revisionismo histórico”, pois as aquisições já foram validadas no passado. Os litígios devem se estender por um bom tempo. Via New York Times (2), The Verge, Facebook (em inglês).

Além da ideologia: Operadoras defendem participação da Huawei no 5G brasileiro.

As operadoras de telefonia brasileiras estavam tranquilas com a guerra ideológica quixotesca do governo federal contra a participação da Huawei no 5G do Brasil. Cometeram o mesmo erro de muitos: o de acreditar que a loucura cessaria quando a conta ficasse cara. Mas aí não seria loucura, certo?

Acendeu-se o alerta nas operadoras após a famigerada reunião entre diretores da Anatel e membros do Ministério da Comunicação com o presidente Jair Bolsonaro, na última terça (24), aquela que antecedeu o disparate de Eduardo Bolsonaro no Twitter que gerou uma crise diplomática com a China. Agora, o governo prepara um decreto com base em normas recentes do Gabinete de Segurança Institucional que exclua a Huawei sem citá-la, um esquema manjado em fraudes de licitações.

Com a realidade batendo à porta, as operadoras se manifestaram publicamente em defesa da Huawei. E não sem justificativa: algumas estimativas calculam em US$ 200 bilhões o custo de trocar toda a infraestrutura da Huawei em uso no Brasil por equipamentos de outras empresas, sem falar que exclui-la do 5G encareceria e atrasaria ainda mais a chegada da tecnologia. E ninguém, com exceção da ala ideológica do governo federal, quer isso.

Dia desses, por coincidência, li uma bela definição de ideologia escrita por Judith Williamson no livro Decoding Advertisements, de 1978 (tradução livre):

Só é ideologia enquanto não a percebemos como tal. E como ela se torna “invisível”, o que a mantém oculta de nós? O fato de que estamos ativos nela, de que não a recebemos de cima: nós constantemente a recriamos. Ela opera através de nós, não em nós. Não somos enganados por alguém “enfiando” falsas ideias: a ideologia funciona de maneira mais sutil. Ela é baseada em falsas suposições.

Isso ajuda a entender o raciocínio do atual governo, aquele que se elegeu prometendo governar “sem ideologia”.

Os Estados Unidos, a quem o governo federal do Brasil tenta agradar com a oposição à China e outros movimentos de vassalagem, não mede esforços para prejudicar a Huawei sob a alegação — ainda não provada — de espionagem. Que os mesmos Estados Unidos espionavam a presidente do Brasil há menos de uma década, ninguém diz nada. Via Telesíntese (2).