O cara marca uma audiência com o presidente e daqui a pouco o presidente está sentado e o cara no celular, conversando com o cara que ele não marcou a audiência. Então, no meu gabinete não entra com celular, celular fica na portaria e nenhuma reunião eu permito celular.

— Luis Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil.

Será Lula leitor deste Manual do Usuário? Via @LulaOficial/YouTube.

Muitos de vocês podem estar se perguntando como temos uma equipe no buscador que está iterando e construindo todas essas coisas novas e, de alguma forma, os usuários ainda não estão muito contentes.

— Prabhakar Raghavan, vice-presidente sênior do Google.

A CNBC obteve o áudio de uma reunião interna do Google em que a empresa debateu o impacto da crise do Reddit na satisfação dos seus usuários. Raghavan lidera o buscador do Google.

Faz algum tempo que uma galera acrescenta “reddit” aos termos da pesquisa para ir direto às comunidades do Reddit, onde pessoas reais escrevem, evitando o oceano de chorume escrito para SEO que polui o Google. Agora imagine o estrago que IAs gerativas tipo ChatGPT causarão… Via CNBC (em inglês).

Lemmy e Kbin, alternativas abertas ao Reddit, cresceram com a crise no rival.

Com toda a comoção em torno do Reddit na última semana, as alternativas abertas no fediverso, Lemmy e Kbin, alcançaram 73 mil usuários ativos nesta segunda (19).

É bastante para esses projetos — os desenvolvedores do Lemmy estão sobrecarregados, bem como diversos servidores com o sistema —, mas algo muito distante de fazer cócegas no Reddit, com seus quase 500 milhões de usuários. Algumas comunidades têm feito um esforço para migrarem, mas talvez o grande lance do Reddit seja o fato de que “todo mundo” já está lá.

Contra o Lemmy/Kbin pesa também o fato de serem ainda mais complicados de usar que o Mastodon.

Tempo de tela não importa muito.

Isto pode soar óbvio, mas vamos lá: nem todo tempo gasto com telas é ruim.

Uma pista de que essa métrica talvez não seja das melhores é o fato dela ter sido abraçada com entusiasmo pela indústria.

Há alguns anos, Apple e Meta enfiaram “medidores” de tempo gasto em celulares e aplicativos em resposta às críticas crescentes ao vício causado por seus produtos.

É quase consenso que passar horas rolando feeds no TikTok ou Instagram faça mal. Por outro lado — e pegando exemplos pessoais —, aquelas dez horas que passei com o tablet ligado lendo um livro, ou o tempo no celular ligando/conversando com pessoas queridas? Zero arrependimento.

Pensata inspirada neste post (em inglês), que propõe uma abordagem qualitativa em vez de quantitativa para o lance das telas.

Bluesky teve fim de semana tenso por suposta ameaça de morte e impasses na moderação.

O fim de semana foi agitado na instância/servidor oficial do Bluesky. Uma decisão da moderação acerca de uma possível ameaça de morte causou revolta em muitos usuários e mudanças nas diretrizes da comunidade.

A moderação decidiu remover o post, mas não banir a pessoa que o postou. Muitas horas depois, a pessoa foi banida.

O problema, como explicou a CEO do Bluesky, Jay Graber, é distinguir uma ameaça de violência de uma metáfora infeliz em um debate acalorado. Dito isso, a diretriz atualizada opta por não fazer distinção alguma:

Qualquer post ou imagem que ameace violência ou dano físico, independentemente de a declaração ser metafórica ou literal, resultará em pelo menos uma suspensão temporária da conta e, para várias violações, removeremos a conta de ser hospedada em nosso servidor.

Muitos usuários do Bluesky não ficaram satisfeitos com a decisão, com a demora na tomada da decisão ou com ambos, como se nota nas respostas ao fio publicado por Jay.

Trata-se de mais uma dor do crescimento que o Bluesky enfrenta, exacerbada pela centralidade ainda presente lá. (Até agora, a opção de múltiplos servidores que conversam entre si ainda não foi ativada e só existe uma instância/servidor de Bluesky, a oficial/dos desenvolvedores.)

Em qualquer etapa da jornada, porém, decisões do tipo jamais serão unânimes. De questões mais mundanas, como assediar usuários incautos para descreverem imagens, até as que parecem óbvias, como uma possível ameaça de morte, há nuances suficientes no discurso para gerar debates acalorados. Atritos são e sempre serão inevitáveis.

(Se o inglês estiver em dia, o joguinho de navegador Moderation Mayhen, do pessoal do TechDirt, é muito didático nesse sentido.)

Governo dos EUA alerta dos riscos do uso de redes sociais por crianças e adolescentes.

Vivek Murthy, cirurgião-geral dos Estados Unidos — uma espécie de porta-voz de saúde pública do governo federal —, publicou na terça (23) um documento alertando dos perigos do uso de redes sociais por menores de idade. Leia na íntegra (PDF, em inglês).

O texto analisa as evidências científicas já disponíveis acerca do uso de redes sociais por crianças e adolescentes, e é bem transparente ao afirmar que essas evidências ainda são insuficientes e que mais pesquisa se faz necessária. De qualquer forma, não dá para esperar evidências mais robustas para agir.

“Nossos filhos se tornaram participantes sem saberem de um experimento de décadas”, diz o cirurgião-geral em um dos trechos mais duros.

O documento reconhece alguns benefícios no uso por menores de idade, em especial para crianças de grupos minorizados. “[As redes sociais] podem fornecer acesso a informações importantes e criar um espaço para autoexpressão. A capacidade de criar e manter amizades online e desenvolver conexões sociais está entre os efeitos positivos do uso das mídias sociais para os jovens.”

Por outro lado, há farta evidência de que o uso dessas mesmas redes pode afetar o desenvolvimento cognitivo de menores de idade e ocasionar ou potencializar o desenvolvimento de condições psicológicas, em especial depressão e ansiedade.

“O uso frequente de redes sociais pode estar associado a mudanças distintas no cérebro em desenvolvimento na amígdala (importante para a aprendizagem e o comportamento emocional) e no córtex pré-frontal (importante para o controle de impulsos, regulação emocional e moderação do comportamento social), e pode aumentar a sensibilidade às recompensas e punições sociais.”

No geral, o alerta é bastante equilibrado e duro com as empresas de tecnologia. Logo no começo, chama à atenção o fato de que, mesmo proibidas para menores de 13 anos nos Estados Unidos, quase 40% das crianças de 8 a 12 anos dizem usar redes sociais.

Apesar das distinções entre as realidades norte-americana e brasileira, os achados talvez sejam universais e as recomendações a pais, legisladores e às próprias crianças e adolescentes, no final do documento, são valiosas. Via Platformer, New York Times (ambos em inglês).

Novas maneiras de organizar conteúdo para “ler/ouvir depois”.

Atualizações recentes dos aplicativos AntennaPod e Pocket me chamaram a atenção por redesenharem a tela inicial. No lugar da antiga lista comprida de coisas salvas (podcasts e artigos da web), apareceu uma tela dinâmica, com vários filtros e até sugestões de conteúdos.

Lembrei-me da máxima de que todo índice cresce até que seja necessária um mecanismo de pesquisa para encontrar o que se deseja, e toda pesquisa cresce até que seja necessária uma curadoria para encontrar o que se deseja.

Não sei ao certo onde as novas telas iniciais do AntennaPod e Pocket se encaixam. Parecem ser respostas a uma espécie de fadiga de conteúdo, um remédio para evitar que os usuários declarem falência das suas listas intermináveis e crescentes de coisas para ouvir/ler “um dia”.

Ainda que eu prefira uma lista ordenada por padrão (gosto dos filtros como opções), artifícios do tipo devem funcionar com muita gente. Afinal, há uma década a maioria trocou o controle absoluto dos feeds RSS pelo caos e incerteza das redes sociais para acompanhar o noticiário. (A expectativa de que chatbots substituirão os buscadores web reforça essa impressão.) Via AntennaPod, Pocket (ambos em inglês).

A polícia da descrição de imagens na internet é um atraso à causa da inclusão

Uma das grandes diferenças entre Mastodon e Bluesky não se nota em comparativos nem em números. É o clima, a atmosfera. Kate Knibbs conseguiu resumir essa sensação no título de um artigo de opinião publicado no início de maio — “Lamento informar que o Bluesky é divertido”.

O Mastodon, ou pelo menos o rincão do fediverso que frequento e que ganhou projeção desde a implosão do Twitter sob o ego de Elon Musk, parece mais sisudo, mais sério. Por vezes, é meio chato. Após anos frequentando e promovendo o Mastodon, acho que detectei uma das pequenas fontes desse mal-estar: a polícia do texto alternativo em imagens.

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Novos jeitos de morrer

Em sua autobiografia publicada em 2016, Rita Lee imaginou a própria morte. Em meio às reações que esperava de fãs, dos jornais e de políticos, escreveu que “nas redes sociais, alguns dirão: ‘Ué, pensei que a véia já tivesse morrido, kkk’”.

A internet e as plataformas digitais mudaram muito da comunicação humana. Não seria diferente com o luto. A exemplo de diversas áreas da vida, a experiência de morte aos que ficam passou por mudanças tão rápidas no digital que parece que foi sempre assim. Só que não foi.

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As dores do crescimento do Bluesky.

Com cerca de dez funcionários, o Bluesky tem sofrido para apagar os múltiplos incêndios gerados pela sua pequena base de usuários, de ~60 mil pessoas.

  • Semana passada, uma falha no software da rede social combinada com inteligências artificiais gerativas e uma “trend” que inundou os feeds de fotos de bumbuns gerou o caos no Bluesky.
  • Antes disso, a chegada do jornalista norte-americano Matthew Yglesias, famoso por suas provocações gratuitas, gerou uma chuva de xingamentos e ameaças contra ele. Problema? O Bluesky ainda não tinha um botão de bloquear perfis.
  • Aqui e ali, há relatos de conteúdo e/ou posts indicando como lidar com neonazistas que teriam conseguido acesso à plataforma.
  • No sábado (6), talvez temendo dores de cabeça com as quais não pode lidar no momento, o perfil oficial do Bluesky anunciou uma proibição um tanto estranha: chefes de Estado estão proibidos de ingressar na rede.

Enquanto isso, a federação segue desligada, o que na prática faz do Bluesky uma rede centralizada no momento, com apenas um servidor ativo.

Descanso não é luxo, é necessidade

E aí, descansou? Certeza? Todo fim de temporada do Tecnocracia eu sugiro em tom assertivo usar o recesso de fim de ano para parar e descansar a cabeça. Em 2022 o conselho foi ainda mais assertivo, dado o quão exaustivo foi o ano, tanto do excesso de trabalho como da pedreira emocional com as eleições de maior impacto desde a redemocratização.

A democracia sobreviveu (todos suspiram de alívio) e o segundo semestre produziu material para décadas de dissertações e teses de política, ciência sociais e psiquiatria, mas terminamos o ano em frangalhos. Usamos, logo, o pouco tempo de recesso e as férias que foram se encavalando frente a tanta coisa urgente para parar tudo, sair da rotina, nadar no meio da tarde, passear quilômetros com o cachorro e usar outras partes da cabeça que não as que a rotina se acomoda.

Depois de tanto tempo fazendo sempre tanto e adaptados a rotinas em que o excesso de atividade eliminou a contemplação, como reaprender a não fazer nada? Mergulhados numa cultura que incentiva de forma quase doentia a produtividade até mesmo nos nossos hobbies, como parar e usar o tempo de que dispomos com a cabeça vazia? Perceba que essa noção de produtividade é tão profunda que meu instinto foi usar o verbo “desperdiçar” tempo, trocado por “usar” ao notar a ironia. Essas não são perguntas retóricas e para explicar eu vou lançar mão de uma história pessoal.

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China declara vitória contra vício de jovens em video games.

Ainda que pareça difícil por fim a isso, o governo chinês declarou o fim do vício em jogos entre menores de idade!?

Segundo relatório lançado no final de novembro, 75% dos jovens jogadores restringiram a atividade a três horas por semana. Ainda segundo o documento, 85% dos pais entrevistados aprovam as medidas de supervisão sobre a jogatina dos jovens implementadas em agosto de 2021, estabelecidas para controlar o tempo que jovens dedicavam ao “ópio espiritual”.

expectativa do setor é de que o novo índice de consumo moderado de games pela juventude abra caminho para a retomada da indústria do videogame na China: desde que as medidas foram adotadas, o país chegou a ficar nove meses sem licenciar nenhum jogo, jejum quebrado em abril de 2022.


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ChatGPT e outras inteligências artificiais impõe dilema a plataformas de conteúdo gerado por usuários.

Os gringos estão fascinados com o ChatGPT, a nova inteligência artificial de conversação da OpenAI — de onde saiu o GPT-3, outra IA capaz de gerar textos completos do nada.

O uso mais provável do ChatGPT é tornar os chatbots ainda mais detestáveis a médio ou longo prazo e engambelar chefes tóxicos (gosto) e professores (zoado). Por ora, a tecnologia tem sido usado como mera curiosidade, uso recreativo. Porque é divertido, sim, mas também porque os usos sérios não demoram a aparecer, como textos completamente equivocados, mas que parecem corretos.

O Stack Overflow, fórum de dúvidas para programadores, baniu temporariamente respostas geradas pelo ChatGPT porque:

[…] a taxa média de respostas corretas obtidas do ChatGPT é muito baixa, e a publicação de respostas criadas pelo ChatGPT é significativamente danosa ao site e aos usuários que perguntam ou buscam por respostas corretas.

O principal problema é que embora as respostas que o ChatGPT produz tenham uma taxa elevada de equívocos, elas geralmente parecem ser boas e as respostas são muito fáceis de serem produzidas.

O banimento é temporário, o que significa que ele poderá ser revertido em breve. Esse dilema, porém, em algum momento atingirá todos os espaços que aceitam conteúdo gerado por usuários (UGC). A questão primordial é: qual a definição de “usuário”?

A Adobe anunciou que vai aceitar e vender imagens geradas por IAs como DALL-E e Stable Diffusion. A única exigência é que elas sejam rotuladas como tais. O Getty Images, o contrário: não aceitará comercializar imagens do tipo.

Como a Adobe garantirá que a rotulagem das imagens submetidas está sendo feita? Até quando o Getty Images resistirá?

Outros conteúdos do Manual para pensar:

Via Stack Overflow, Axios, The Verge (todos em inglês).

VAR, vigilância e subjetividade em campo na Copa do Mundo do Catar, com Hudson Martins

Curte o Guia Prático? Então tire um minutinho do seu dia para responder a nossa pesquisa: https://tally.so/r/n0VMN0

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Bem amigos do Manual do Usuário! No podcast desta semana, Rodrigo Ghedin e Jacqueline Lafloufa falam de futebol, ou das tecnologias que invadiram os gramados para (supostamente) tornar o jogo mais justo. E tivemos reforço: Hudson Martins, mestre em educação física pela Unicamp e coordenador geral da CBF School em Campinas (SP), entrou em campo para nos ajudar a entender os impactos do VAR dentro das quatro linhas. (E com este parágrafo, esgotei as minhas reservas de referências futebolísticas.)

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Se a internet revolucionou como consumimos sexo, por que estamos transando menos?

Em 1903, dois imigrantes que chegaram aos Estados Unidos fugindo do Império Russo deram à luz a um sujeito chamado Gregory Pincus. Ninguém sabia ainda, mas Pincus seria considerado, décadas mais tarde, um gênio. Depois de se formar em biologia na Universidade de Cornell e defender com sucesso seu mestrado e doutorado na Universidade de Harvard, Pincus encontrou a grande área da biologia que o interessava: a reprodução e o papel dos hormônios nela.

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