Sem rupturas entre China e EUA

Dando sequência às visitas de autoridades estadunidenses a Pequim, esta foi a vez de Gina Raimondo, a secretária de Comércio dos EUA. Ela se encontrou com o primeiro-ministro Li Qiang na terça (29) e o vice He Lifang.

Entre os destaques dos encontros está a afirmação de Raimondo de que seu país não quer romper com a China, porém acrescentou que preocupa Washington a forma como empresas estrangeiras são recebidas em solo chinês, passando por questões de segurança. Ela afirmou ainda que os empresários estadunidenses se queixam de que a China é um país “ininvestível”.

Apesar de durante a visita a secretária ter tratado as relações comerciais dos dois países em tom mais amistoso, há menos de um mês a administração Biden anunciou restrições de investimentos no país asiático em áreas estratégicas.

Por falar em questões estratégicas, o mandarim parece ter deixado de ser visto como uma língua prioritária para estudantes estadunidenses, como mostra a The Economist. A língua oficial da segunda maior economia global chegou a ser apontada por líderes como algo que deveria ser estudado, caso do ex-presidente Barack Obama.

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Cooperação científica entre China e EUA em risco

Não é novidade o aumento das tensões tendo impacto no campo científico (tanto na pesquisa quanto no ensino).

Agora, um dos mais antigos acordos bilaterais entre os dois — firmado há 44 anos — está na corda bamba, como explica este texto do Axios: o U.S.-China Science and Technology Agreement (STA), assinado em 1979. Ele está em fase de renovação, mas está ameaçado por uma série de questões geopolíticas, pânico de espionagem e xenofobia.

O secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken, recebeu uma carta da comissão da Câmara do país — principalmente por pressão do Partido Republicano — recomendando a não renovação do acordo. Mas como explica este artigo (e o fio) de Karen Hao para o Wall Street Journal, a situação é mais complexa para os estadunidenses, que possuem uma dependência de pesquisa chinesa em diversas áreas importantes — ao contrário do que muita gente acha.

De fato, os papers científicos sino-estadunidenses sempre impactam a literatura e o fim dessa colaboração é ruim para todo mundo.

Mesmo assim, continuam as visitas oficiais de autoridades dos EUA à China. Essa semana é a vez da secretária de comércio Gina Raimondo, que chega a Pequim no domingo (27) e fica por quatro dias, onde manterá encontros com autoridades e empresários e para discutir restrições recentes de investimentos.

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Reconhecimento facial na mira da China

A Administração do Ciberespaço da China, órgão que regulamenta a internet no país, abriu para consulta pública o rascunho de regras para restringir o uso de tecnologia de reconhecimento facial em território nacional.

Com 25 artigos, a proposta proibiria o uso dessa tecnologia como forma de verificação de identidade em bancos, hotéis, aeroportos, bibliotecas e estabelecimentos comerciais, a não ser que seja exigido por lei — e, nesse caso, sistemas nacionais de reconhecimento facial devem ser utilizados.

Como explica Evelyn Cheng para a CNBC, o reconhecimento facial pode ser usado atualmente para realizar pagamentos em algumas lojas, estações de metrô e para entrar em prédios e campi universitários.

As regras propostas também estabelecem que essa tecnologia somente deve ser usada quando outros métodos de verificação de identidade não-biométricos não forem suficientes e que é necessário obter consentimento e declaração de fim específico do uso dos dados coletados. Chama atenção o artigo 11, que preconiza que nenhuma organização ou indivíduo pode usar a tecnologia de reconhecimento facial para obter dados relacionados a raça, etnia, religião, classe social e demais dados sensíveis. A consulta pública está aberta até sete de setembro e o rascunho da proposta pode ser lido aqui (em chinês). Uma tradução para o inglês foi disponibilizada pelo China Law Translate.

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China quer limitar o uso de internet por menores

Depois dos jogos de videogame, chegou a hora de o Partido Comunista Chinês (PCCh) lançar diretrizes para o controle do uso de celulares e da internet por menores de idade no país.

O pacote de diretrizes foi lançado na última quarta (2) e foi cuidadosamente detalhado pelo China Law Translate.

Será necessário logar no modo “menor” ou “maior” quando cada usuário acessa os dispositivos móveis, e cada modo tem restrições distintas, semelhante ao que acontece com alguns canais de streaming, por exemplo.

A legislação visa controlar o conteúdo e também o tempo que cada menor de idade passa na internet. A Bloomberg publicou uma reportagem [sem paywall] sobre como isso deve impactar os negócios de empresas como a Tencent e a ByteDance.

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Também na China, IA se alimenta de trabalho precarizado

Quando trabalho existe em alimentar a inteligência artificial? Muito.

Para criar padrões de análise e oferecer respostas, os programas como ChatGPT ou MidJourney (de imagens) precisam de dados detalhados, estruturados e catalogados.

Esta tradução de Jeffrey Ding (do ChinaAI) de um artigo publicado na 南风窗 (South Reviews) conta a história de mulheres chinesas sem ensino superior, com filhos e morando no campo que estão fazendo esse trabalho — normalmente mal pago, mas que tem sido importante para complementar a renda da família.

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Montadoras chinesas ocupam vácuo deixado por europeias e norte-americanas em fábricas no Brasil

Se a indústria automobilística do Brasil vem sofrendo com a debandada das montadoras europeias e estadunidenses, agora está gerando oportunidades para as chinesas.

A BYD anunciou na semana passada (20) que deve abrir um complexo industrial na Bahia, em espaço que antes comportava a produção da Ford. Com um investimento de R$3 bilhões, a expectativa é de que a fabricação de veículos híbridos e elétricos gere 5 mil novos empregos na cidade de Camaçari.

A maior fabricante de veículos elétricos do mundo não está sozinha: a Great Wall Motor deve iniciar sua produção em São Paulo em 2024, ocupando um espaço deixado pela Mercedes-Benz.

O objetivo das montadoras chinesas no Brasil é conquistar o mercado latino-americano e facilitar exportações para os Estados Unidos e Canadá.

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Mais um capítulo na guerra dos chips

A China vai restringir a exportação de matérias-primas necessárias para a fabricação de chips, especialmente gálio e germânio.

Segundo comunicado do Ministério do Comércio divulgado na segunda-feira (3), fornecedores desses materiais devem solicitar licenças de exportação às autoridades chinesas já a partir de agosto de 2023.

A jornalista Rebecca Choong Wilkins resumiu os pontos de maior interesse.

Como coloca o Asia Times, com a medida, Pequim espera ganhar tempo para aprimorar sua indústria, enquanto empresas estadunidenses, japonesas e europeias lidam com as consequências do fim do fornecimento dos materiais.

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Shein leva influenciadoras dos EUA à China e posts delas geram questionamentos

A Shein convidou seis influenciadores de moda e beleza estadunidenses para visitar seu centro de inovação em Guangzhou e um centro de distribuição em Zhaoqing. Até aí, normal.

O que causou alvoroço foram as afirmações que as jovens fizeram em seus posts: de que as condições de trabalho nas fábricas da marca seriam ótimas (“eles nem suam!”), que só ouviram depoimentos elogiosos dos funcionários e que dizer o contrário seria uma narrativa usada nos EUA contra a marca.

Muito rapidamente, seguidores começaram a encontrar indícios de que os cenários e pessoas escolhidas para a visita talvez não fossem tão autênticos quanto as jovens afirmavam e que elas estavam fazendo um trabalho de limpeza de imagem para a empresa — algo de que a Anitta também vem sendo acusada.

Talvez não tenha valido o investimento do time de marketing: algumas influenciadoras acabaram apagando as postagens ou mesmo se retratando, e as redes sociais receberam uma onda de comentários negativos sobre a empresa, relembrando notícias negativas sobre as condições trabalhistas associadas a seus produtos.

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Governo chinês quer regular AirDrop.

As autoridades chinesas reguladoras do ciberespaço propuseram novas regras para a regulação de serviços similares ao AirDrop, recurso da Apple para compartilhar arquivos e fotos de forma facilitada usando Bluetooth ou Wi-Fi.

O China Law Translate traduziu para o inglês o rascunho público aberto para comentários — as propostas se desenham de forma similar a outras previsões para serviços de internet no país.

Como resumiu Jeremy Daum, essas regras incluem a necessidade de consentimento das partes envolvidas para o envio (inclusive para a visualização de preview). Um dos focos é a disseminação de notícias falsas e preocupação com a segurança nacional. Um momento curioso, já que contamos sobre o ShareIt, aplicativo similar chinês, algumas semanas atrás. Também vale lembrar que o AirDrop foi bastante utilizado durante os protestos pelo fim das restrições de Covid Zero no ano passado e em Hong Kong em 2019.

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60% dos usuários de 5G do mundo estão na China.

Ainda disponível somente em mandarim, o Relatório de Desenvolvimento da China Digital 2022 traz informações sobre a economia digital do país. O relatório indica que a China tem cerca de 60% dos usuários de 5G do mundo, como resume o Yahoo.

Outros dados interessantes são a expansão no âmbito de cibersegurança e que os serviços digitais do governo já tem mais de 1 bilhão de usuários.

Não deixe de ler junto com o “Plano para o desenho geral da construção de uma China digital”, lançado em fevereiro.

Vale também aproveitar a louça suja para ouvir este episódio (em inglês) do podcast China Global sobre a ascensão do país na ordem mundial digital.

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Na corrida do ouro das IAs, Nvidia vende as melhores pás e se aproxima de valer US$ 1 trilhão.

As ações da Nvidia deram um salto de quase 25% semana passada, fazendo com que seu valor de mercado encostasse no US$ 1 trilhão. Se chegar lá, será a primeira do setor de semicondutores a valer tanto.

A empresa encarna o espírito de “vendedor de pás” na corrida do ouro do momento — a das inteligências artificiais. O chip H100, lançado em 2022 e vendido por US$ 40 mil a unidade, é um avanço significativo no processamento de grandes volumes de dados e está por trás de mega-sucessos recentes, como o ChatGPT.

A posição da Nvidia permite que a empresa dê declarações menos protocolares, mais interessantes que as de outras companhias mais próximas do usuário final, como Microsoft e Google. Jensen Huang, CEO da Nvidia, critica abertamente as sanções que os Estados Unidos impuseram à China e que impedem a sua empresa de vender para o gigante oriental. “Se [a China] não puder comprar dos EUA, eles mesmos vão fazer. Os EUA devem ter cuidado”, disse ele em entrevista ao Financial Times.

Nesta segunda (29), a Nvidia anunciou novidades em um evento de 2h na Computex, em Taiwan, incluindo uma plataforma de computação específica para aplicações de IA, batizada DGX GH200. Via Financial Times, Tom’s Hardware (ambos em inglês), Folha de S.Paulo.

O jeitinho chinês para driblar as sanções dos EUA para a importação de chips.

As sanções sofridas pela China estão impulsionando um jeitinho para resolver problemas. A matéria de Karen Hao e Raffaelle Huang para o The Wall Street Journal conta como as empresas chinesas estão mitigando o efeito das sanções impostas pelo governo dos EUA na exportação de semicondutores para o país.

Desde o segundo semestre de 2022, diversas companhias, como Huawei e Alibaba, não podem importar os chips de ponta produzidos nos Estados Unidos e usados principalmente para o desenvolvimento de inteligência artificial.

Hao explica que a solução tem sido treinar a IA com diferentes chips (chamada de computação heterogênea) e testar outras técnicas para obter resultados similares. Não vai ser fácil, mas o Alibaba já tem experiência nessa lógica na construção do seu sistema de nuvem, como apontou Zac Haluza.

A questão dos chips também foi discutida pela pesquisadora Megha Shrivastava em texto para o The Diplomat. Ela analisa a estratégia chinesa nessa nova circunstância de disputa com os EUA e as possíveis medidas retaliatórias — algumas já implementadas, como a recém-anunciada proibição do uso de chips da empresa estadunidense Micron por parte de operadores de infraestrutura crítica.

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Na China, gerar notícias falsas com ChatGPT dá prisão.

Não bastasse ter sido um dos primeiros países a avançar na criação de legislação sobre o uso de inteligência artificial gerativa, ao que tudo indica a China é pioneira em realizar uma prisão pelo uso impróprio do ChatGPT.

O motivo: usar o programa para criar notícias falsas sobre um acidente de trem que teria resultado em nove mortos. O caso aconteceu em final de abril e se encaixou na legislação já vigente de perturbação da paz pública — que inclui o ciberespaço, explica o The China Project.

O rascunho da legislação sobre IA e ferramentas como o ChatGPT ainda está em tramitação. Vale muito a pena ouvir o episódio mais recente do Sinica Podcast sobre toda essa regulação, com Kendra Schaefer e Jeremy Daum. O próprio Daum também fez um fio recente no Twitter sobre a publicação de conteúdo gerado por IA no Douyin (a versão chinesa do TikTok).

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